O legado de Godfrey Hounsfield, inventor da tomografia computadorizada
A tomografia computadorizada se tornou um exame de imagem onipresente em todo o mundo, oferecendo insights poderosos sobre o corpo humano. E, um dos maiores responsáveis pelo desenvolvimento da TC vai para Sir Godfrey Hounsfield, o cientista do Reino Unido que desenvolveu o primeiro scanner de TC em 1971.
Natural de Nottinghamshire, Reino Unido, Hounsfield nasceu em 28 de agosto de 1919, em uma família humilde. Apesar de sua curiosidade natural, Hounsfield não era um estudante estelar e não seguiu o ensino superior formal. Ele tinha uma compreensão prática de engenharia, no entanto, e começou a trabalhar no escritório de desenho de um construtor local.
Quando a Segunda Guerra Mundial estourou, Hounsfield se juntou à Royal Air Force (RAF). Lá, ele teve a oportunidade de aprender sobre mecânica de rádio e tornou-se instrutor de mecânica de radar. Seu primeiro posto foi no Royal College of Science em South Kensington, no Reino Unido (agora parte do Imperial College London).
Um dos oficiais superiores da RAF tomou conhecimento das habilidades de Hounsfield e facilitou, por meio de uma bolsa, seus estudos após a Segunda Guerra Mundial no Faraday House Electrical Engineering College, em Londres, onde recebeu um diploma em engenharia elétrica.
O próximo passo significativo na carreira de Hounsfield foi em 1951, quando ele começou a trabalhar no conglomerado industrial britânico Electrical and Musical Industry (EMI) Limited. A EMI era talvez mais conhecida como a gravadora dos Beatles.
Hounsfield teria uma longa carreira na EMI, começando com a pesquisa de sistemas de armas guiadas e ciência de radar. Ele também era interessado em computadores e liderou o projeto de um computador de transistores comercialmente disponível chamado EMIDEC 1100, que foi lançado em 1959.
Criação da Tomografia Computadorizada
Em 1967, informou aos supervisores sobre uma ideia de desenvolver um dispositivo que reuniria raios-x de um objeto de vários ângulos e os reuniria em uma representação 3D, com o objetivo de ajudar os médicos a ver o interior do corpo humano.
Hounsfield recebeu uma bolsa do governo britânico para prosseguir com a pesquisa. Ele colaborou com dois radiologistas, Dr. James Ambrose e Dr. Louis Kreel, que o ajudaram a compreender os princípios da radiologia. Eles também forneceram amostras de tecidos e animais de teste para escaneamento experimental.
Suas investigações também se basearam no trabalho de Allan MacLeod Cormack, um físico da África do Sul que publicou artigos pioneiros sobre a teoria por trás da tomografia computadorizada em 1963 e 1964, enquanto estava na Universidade da Cidade do Cabo.
Esses esforços iniciais foram limitados pela tecnologia da época: as primeiras imagens fantasmas levaram nove dias para aquisição e 15 minutos de tempo computacional para reconstrução. Mas não demorou muito para que a equipe de Hounsfield projetasse e construísse um protótipo de scanner CAT para a cabeça. A máquina foi testada primeiramente em um cadáver, depois em um cérebro de vaca de um açougue, depois em si mesmo.
Um scanner de cabeça CAT logo foi instalado no Atkinson Morley Hospital, em Londres, onde o primeiro exame foi realizado em um paciente humano em 1º de outubro de 1971, com a imagem bem-sucedida de um cisto cerebral. Uma fatia de 1 cm era adquirida em cerca de quatro minutos, e os dados tinham de ser transferidos por meio de fita magnética para um laboratório da EMI nas proximidades para serem reconstruídos em imagens.
Os resultados desses esforços foram apresentados no congresso anual do Instituto Britânico de Radiologia em 1972 em um artigo de Hounsfield e Ambrose. O acontecimento ganhou atenção e cobertura na grande imprensa, com o Times de Londres relatando em sua publicação de 21 de abril de 1972.
A CAT (que logo foi renomeada para CT — em inglês) tornou-se uma ferramenta de diagnóstico muito eficaz, principalmente por causa de sua capacidade de diagnosticar lesões estruturais no cérebro. Substituiu técnicas mais invasivas, como pneumoencefalografia ou angiografia carotídea, que eram usadas para visualizar patologia cerebral.
Como acontece com a maioria das novas tecnologias, as primeiras preocupações foram expressas sobre o custo dessa nova ferramenta para o sistema médico. Mas o valor da TC logo se tornou aparente até mesmo para os céticos, pois demonstrou sua superioridade sobre a radiografia convencional para uma variedade de aplicações clínicas.
Constante desenvolvimento
Agora liderando a seção de sistemas médicos da EMI, Hounsfield continuou a melhorar a tecnologia de escaneamento reduzindo a exposição à radiação, aprimorando as imagens e desenvolvendo scanners maiores que poderiam capturar imagens de outras partes do corpo, até chegar ao scanner de TC de corpo inteiro.
Na década de 1980, tornou-se consultor de um laboratório de pesquisa da EMI, onde trabalhou para refinar o tomógrafo e desenvolver um modelo que pudesse capturar uma imagem precisa do coração. Posteriormente, ele se concentrou no que foi chamado de imagem magnética nuclear, agora chamada de ressonância magnética.
Hounsfield recebeu vários prêmios por suas realizações, sendo o mais notável o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1979, uma honra que ele compartilhou com Cormack.
Hounsfield foi nomeado Comandante da Ordem do Império Britânico em 1976 e cavaleiro em 1981. Ele também recebeu um doutorado honorário da City University of London, entre outros reconhecimentos.
Além de ser um grande inovador na ciência, Hounsfield era músico de jazz, cinéfilo e ilustrador. Ele também gostava de esquiar, fazer caminhadas e tocar piano, o que ele aprendeu sozinho a fazer.
Hounsfield morreu em Londres em 12 de agosto de 2004, aos 84 anos, apenas duas semanas antes de completar 85 anos. Ele nunca se casou e não teve filhos.
Em seu testamento, Hounsfield estipulou que houvesse uma doação ao Instituto Britânico de Radiologia para manter uma palestra anual em seu nome; a primeira palestra de Godfrey Hounsfield foi proferida em 1997. Outra demonstração de seu legado na radiologia é a unidade Hounsfield (HU), uma medida de atenuação de TC.
Sem dúvida, a invenção da TC por Hounsfield foi indescritivelmente significativa para a radiologia, pois revolucionou o diagnóstico médico. Embora Hounsfield não tenha recebido uma educação clássica e não tenha nascido de privilégios econômicos, essas barreiras não impediram suas atividades científicas. Sua imaginação e impulso para a descoberta científica não conheciam limites.